quinta-feira, 21 de julho de 2011

NEVERMIND: VINTE ANOS

A revista americana Spin publicou um artigo, em sua versão virtual, (link) no qual artistas e pessoas do meio musical (entre as mais relevantes Dave Grohl e Eddie Vedder) deram depoimentos descrevendo a importância do álbum Nevermind do Nirvana em suas vidas, quando lançado, em 1991. Entre histórias curiosas e outras nem tanto, é quase unânime que este disco já nasceu como um clássico e que sua relevância, vinte anos depois, ainda é significativa, para a lendária cena Grunge de Seattle, para o rock e para a música como um todo. 

Pegando carona na ideia da revista Spin, resolvi dar meu depoimento sobre ‘What Nirvana’s Nevermind means to me’ (o que o Nevermind do Nirvana significa pra mim). Não que eu seja artista ou seja do meio musical, mas como fã que sou desde aquela época, acho que tenho uma parcela de culpa pela disseminação do som do Nirvana por aqui – pelo menos entre meus amigos –, portanto acho que posso falar como alguém que viveu a época, mesmo que tão longe da emblemática cidade de Seattle.

Pra uma criança que cresceu ouvindo Beatles, Creedence Clearwater Revival, Eagles, Roberto Carlos, Bezerra da Silva, entre outros, era meio difícil fugir do rock. Eu sei, Bezerra da Silva e RC não são rock, é que era meu pai que ouvia tudo isso, eu peguei carona e dei uma evoluída, por assim dizer – ele regrediu... fazer o quê, né mesmo? Enfim, lá pelos idos de 1993 (sim, só ouvi o álbum dois anos depois de lançado, a palavra download nem existia nessa época, meus pequenos infantes), quando eu já ouvia – por conta própria – Guns n’ Roses, Legião Urbana, 4 Non Blondies, Michael Jackson e Aerosmith, me deparei com uma fita k7 (pros mais novos, vão lá no Google) de uma certa banda chamada Nirvana, o nome do álbum era Nevermind (que o dono da fita escreveu errado; Nervermino). Foi algo tão enlouquecedor quando ouvi aquele refrão incompreensível berrado pelo Kurt, em Smells Like Teen Spirit, era algo tão fora dos padrões pra mim, foi como uma expansão da mente, era algo revolucionário, ainda mais pra uma criança de oito anos de idade. Eu simplesmente não conseguia parar de ouvir o álbum do começo ao fim  repetidas vezes (lembro que minha mãe odiava a faixa Territorial Pissings), e a cada audição da fita eu gostava mais do que eu ouvia. Enfim, é o álbum mais marcante da minha vida, sem dúvida, tanto que anos mais tarde com a popularização do CD, foi minha primeira aquisição no formato compact disc e o tenho até hoje. Daí pras outras bandas de Seattle foi um pulo. E eu já me auto-intitulava “grunge”. Sem a camisa de flanela... Bahia, né galera, faz calor e tal...

quinta-feira, 14 de julho de 2011

ALEATÓRIO

Silhueta de pureza... Despida em sua beleza... Dos delírios de um solitário... De um coração encarcerado... Ah, os mistérios que a escondem... Névoas dos sonhos de ontem... De outrem... Da natureza indomada... De alma ensolarada... Templo de desejos sussurrados... De lembrar-se do sabor que fica... Que entorpece e vicia... Ah, e quando as almas se separam... E resta apenas o calor que exalam... Em seus dias de espera... Dormem e se disfarçam... Uma proposital indiferença indesejada... O óbvio sentimento que se cala... Reflexo vulnerável... Os dias que os distanciam lentamente... As expressões escondidas sob o véu... Os porquês insistentes... Ah, como estes olhos gostariam de enxergar através das palavras... Decifrar seu sorridente silêncio... Abraçá-la enquanto fala... Ouvir seus versos como música... Depois acordar... Dos delírios solitários de um coração despedaçado...

terça-feira, 28 de junho de 2011

QUATRO DE JULHO (4th Of July) - Tradução Livre

Faíscas limpas mergulhando
Frio num canal de água
Onde os batizados afundam...
Despido sob um frio sol
Respirando vida como fogo
Pensei que eu fosse o único
Mas era apenas uma mentira


Porque eu o ouvi no vento
E eu vi no céu
Pensei que fosse o fim
Pensei que fosse o 4 de julho


Pálido no clarão
A luz assustadora estala e desaparece
E conduz os chamuscados aqui
E em todo lugar ninguém se importa
O fogo está se alastrando
E ninguém quer falar sobre isso
No fundo do buraco
Jesus tenta rachar um sorriso
Debaixo de mais uma pá carregada


Agora estou sob controle, agora estou decaindo
Certa vez sonolento, mas agora estou de pé
E eu ainda me lembro de toda a sua doçura
Acenda uma vela romana e segure-a em sua mão




De Chris Cornell e Soundgarden. Álbum "Superunknown" - 1994


P.s.: Tô numa overdose de Soundgarden ultimamente.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

CRÔNICAS NOTURNAS

Acordei de ressaca num quarto escuro de algum motel vagabundo. Ainda cambaleante, procuro por minhas roupas, quando percebo as algemas presas em meu pulso esquerdo – ela teve a bondade de me soltar antes de ir – acho que isso fez parte das “brincadeiras” da última noite. Noite que começou com uma aposta vencida – gosto de apostar em esportes (boxe, NBA, F1, e é claro, futebol), acho que é a única coisa que entendo. Com dinheiro sobrando, fui curtir a noite sozinho, como sempre. Depois de um show de uma banda de brit-pop-brasileiro, num conhecido bar da cidade, de algumas cervejas e poucas doses de vodka, resolvi explorar o lado Red Light District da metrópole, pela primeira vez.

Ouvi um som familiar vindo de uma porta discreta numa rua levemente iluminada e resolvi entrar. Ao passar pela revista do segurança, que mais parecia um cover do Evander Hollyfield nos bons tempos, vi uma loira de corpo escultural dançando seminua, em um palco com um poste no meio, e o melhor, ao som de “Dirt” do Alice in Chains (este era o som familiar), para a felicidade dos meus tímpanos cansados, e é claro, dos meus olhos também. Com uma trilha sonora dessas, não tive dúvidas de que ficaria ali naquela noite.

Enquanto a maioria dos caras observavam maravilhados àquela demonstração de desinibição e ousadia da moça – admito que era de impressionar – eu , por minha vez, preferi sentar no bar para apreciar algumas bebidas, já que minha noite etílica era fraca, até então, e eu também já passei da idade de me empolgar tanto com nudez gratuita. Claro que, de vez em quando, observava o show, mesmo de longe. Embora a apresentação estivesse deveras interessante, a garota do bar me chamou mais a atenção. Ela entendia de bebidas, dizia-se bartender. Me chamou de simplista, por pedir apenas bebidas puras (disse que eu não gostava de arriscar por medo de errar, uma ofensa para um jogador). Já me chamaram de muita coisa, menos de simplista. Ok, ela conseguiu minha atenção.

Ela não era dessas mulheres que despertam a curiosidade pelo corpo, como a loira que dançava no palco (que a essa altura já não vestia mais nada além de uma pulseira), tinha uma beleza enigmática por trás daqueles olhos grandes e maliciosamente tímidos, que fazem você querer desvendá-la, mas com cautela. Cabelos pretos cortados na altura do pescoço, uma pele dourada decorada com coloridas tatuagens... Ela tinha um ar meio Brody Dalle, mas não tão agressiva, pelo menos no visual. Por algum motivo ela também se interessou por mim, pois àquela altura já nem dava atenção aos outros clientes do bar, e fazia questão de ensinar a preparar cada drink que me servia.

Conversamos bastante, descobrimos muitas coisas em comum e lá pelas 2h30 da madrugada, ela deixou o bar para a outra garçonete e sentou-se comigo para beber também. E antes de tomar o primeiro gole de cerveja, ela me beijou, e vendo minha surpresa, perguntou: “Que foi? Pra quê perder tempo?”. E não perdemos. Depois de uns drinks a mais, saímos do bar. O resto da história, já dá pra imaginar. A impulsividade e a intensidade... A leveza e a agressividade... A sutileza e a paixão...

Surpreendente e incomparável até o fim...

Depois de tomar banho no banheiro do quarto, visto minhas roupas e saio do motel. Um dia de sol no inverno à beira da praia, depois de caminhar um pouco. Não estou derretendo dentro do meu terno surrado, pois, apesar do sol, não faz calor e uma brisa gelada que sopra do mar faz os corredores matinais usarem mais roupas que o usual. Paro em frente ao atlântico e sento num banco na calçada. Amarro o cadarço do meu tênis surrado, acendo meu último cigarro e com um leve sorriso de canto de boca, lembro, em fragmentos, da noite anterior. Da aposta vencida, daquela banda de brit-pop, do bar de strippers e da bartender girl, de quem sequer me lembrei de perguntar o nome.

Mexo no bolso esquerdo do blazer e encontro um papel amassado. Número e o nome dela; Frida... Exótico, quase erótico... E ela tão meiga e agressiva ao mesmo tempo, quase imperceptível e tão cativante, um ar desafiador por trás daquela timidez atraente, um senso de humor inocentemente ácido... E aqueles olhos grandes, aquele olhar penetrante que intimida e ao mesmo tempo faz-te querer ser destroçado por sua volúpia disfarçada. Como eu fui. Tão linda, tão... O tipo da garota pela qual eu me apaixonaria... Daquelas que te fazem cometer devaneios impensáveis para conseguir o mínimo da atenção dela, dessas que destroçam seu coração por fazer questão de demonstrar que não precisa de você, que te fazem expor a fraqueza que você se esforça pra mostrar que não tem... E tudo o que tenho que fazer é ficar longe dela... Isso resolve tudo... (joguei no mar aquele pedaço de papel amassado)


quinta-feira, 26 de maio de 2011

CANÇÃO DO SILÊNCIO

Se eu pudesse não me arrepender... Se eu pudesse ter esperança...

Se eu conseguisse acreditar... Se eu tivesse o dom (ou maldição) da fé...

Se eu conseguisse dormir... Se eu expurgasse meu pessimismo...

Se eu tivesse medo... Se eu controlasse meus impulsos...

Se eu controlasse minha sinceridade... Se eu não me perdesse na madrugada...

Se eu não me questionasse... Se eu não mergulhasse em garrafas de vodka...

Se minha memória não insistisse em me lembrar...

Se em minhas veias, meu sangue estivesse limpo...

Se em meus olhos houvesse brilho... Se minha voz não me irritasse tanto...

Se o silêncio em minha mente não fosse tão perturbador... Se fosse fácil fugir de meu inferno...

E meus demônios fossem domáveis... Se eu não ocultasse meu entusiasmo...

Se eu pudesse recolher as minhas cinzas... Depois do fogo que me consumiu...

Ah... E se naquela noite os desejos fossem reprimidos... 

Se aqueles dias não tivessem me feito tão feliz... Como nunca fui...

Se aqueles dias não tivessem importância... Eu esqueceria...

Se apenas desculpas bastassem... Minha corrosão não seria tão dolorosa...

Se um dia eu me curar da tristeza dessa ausência... Poderei partir em paz...

E se meu coração obedecesse minha lógica... Eu não te amaria tanto assim...



"And she knows..."

quarta-feira, 4 de maio de 2011

CELEBRAÇÃO DO MEDO

Quem não se lembra do 11 de setembro de 2001? Da imagem das torres do World Trade Center, em New York, em chamas como num filme apocalíptico do Roland Emmerich. Do desespero de quem fugia do local do atentado, da revolta de boa parte do mundo ocidental, quando o auto-proclamado autor do atentado, Osama Bin Laden, revelou-se para o planeta. Lembro também que em muitos países do Oriente Médio, muitas pessoas, que nutriam o sentimento anti-americano, saíram às ruas para comemorar o sucesso do ataque ao coração da “capital do mundo”, ao símbolo maior do capitalismo e do “american way of life”. Sim, lembro de muita gente por aqui que achou um absurdo a alegria dessas pessoas diante de ato tão desumano.

Quase dez anos depois, após caçada implacável em cavernas nas montanhas do oriente, que resultou em duas guerras, em dois países diferentes, muitas vidas de inocentes perdidas, instabilidade na economia mundial, dúvida da sanidade mental do então presidente estadunidense George Walker Bush, eis que as agências de notícias do mundo inteiro noticiam na madrugada de segunda-feira que o homem mais procurado do planeta fora finalmente morto por tropas americanas. Resultado: Festa na terra dos Yankees! A população saindo às ruas, com tremulantes bandeiras americanas, celebrando mais efusivamente que nós brasileiros quando a Seleção nacional de futebol retorna do exterior com a Copa do Mundo. Sim, as pessoas estavam felizes; felizes porque um homem foi assassinado.

Bem, todos sabem que Osama Bin Laden não era uma boa pessoa, que orquestrava atentados em todo o mundo, que tirou a vida de vários inocentes, usando e distorcendo a religião que nada tem a ver com as atrocidades que ele cometia. Não estou questionando se ele merecia ou não morrer, talvez até merecesse. Mas a cena de pessoas comemorando a morte de outra, estejam elas no oriente, no ocidente, no norte ou no sul, como se fosse uma festa, simplesmente não entra na minha cabeça. Esta é a humanidade que estamos construindo? Que simplesmente adota a vingança como política em troca de popularidade? Que festeja a morte de outros seres humanos com tanta euforia? Sinceramente não entendo...

Entendo que se sintam aliviados por um terrorista não estar mais entre os vivos, que ele não pode mais fazer mal a ninguém, – não que a morte dele tenha sanado a ameaça terrorista no mundo – mas promover uma celebração coletiva com sorrisos e com tanta paixão, pela morte de seres humanos? Não me refiro apenas aos norte-americanos, mas também àqueles que lá no oriente, em 2001 também celebraram as mortes no World Trade Center. Somos tão bárbaros assim mesmo? É isso que chamamos de civilização? É assim que nos auto-intitulamos evoluídos? Se for isso que chamamos de humanidade, tenho vergonha de fazer parte dela.

Os noticiários e o governo americano tentam passar uma imagem de vitoriosos, propagam que “venceram a ameaça”, que o mundo é um lugar melhor agora, que Osama Bin Laden foi derrotado. Bem, o planeta vive em permanente estado alerta, as sociedades, tanto ocidentais quantos as orientais aumentam diariamente seus níveis de segurança, os próprios Estados Unidos da América vivem a paranóia da segurança extrema, onde qualquer incêndio em pet shop, vira suspeita de terrorismo. Estão governados pelo medo. E mesmo assim acham que venceram? Se isso é vitória, o preço foi alto demais.

domingo, 1 de maio de 2011

MEU PRIMEIRO HERÓI

Eram tempos de brincadeiras de criança, de andar de bicicleta, de odiar acordar cedo para ir à escola, mas aos domingos era um prazer levantar antes do relógio marcar dois dígitos. Era diversão, era idolatria, era religião. No país do futebol, o automobilismo – mais especificamente a Fórmula 1 – tornava-se o esporte mais popular do Brasil, e tudo graças a um homem, uma lenda, um brasileiro: Ayrton Senna da Silva.

Eu não tinha idade pra entender o que ele representava para um país recém-saído de uma ditadura militar, que não dava aos seus cidadãos motivos para orgulhar-se de sua terra, mas para mim ele era um herói, no mais puro sentido da palavra. Achava que ele tinha poderes, que era invencível, eu queria ser como ele. Queria todos os brinquedos que faziam alguma referência à Senna ou à F1. Apostando corrida de bicicleta com amigos, eu dizia que meu nome era Senna, era também o nome que usava no Top Gear, do Super Nintendo (zerei o jogo com este nome! hehehe).

Eram tempos em que os pilotos controlavam as máquinas e não as máquinas que faziam os campeões. E Senna era um vencedor, obcecado pela vitória, pela competição. Quando entrava no cockpit, nada mais importava, só a corrida, só a vitória.

Era incrível vê-lo correr e após receber a bandeirada final como vencedor, parar em algum ponto da pista para pegar a bandeira brasileira e exibi-la tremulante até o ponto mais alto do pódio. Posso dizer que ele me fez entender o que era ser parte de um país, e de alguma forma ter orgulho de ter nascido no mesmo país de uma figura tão impressionante.

Bem, hoje é 1 de maio, dia da morte de Senna, há dezessete anos, no circuito de Ímola, na Itália. Eu poderia escrever linhas e mais linhas de como me senti naquele dia, mas tenho certeza de que não saberia explicar a sensação. Só posso dizer que foi muito doloroso ver meu primeiro herói morrer ao vivo. E embora ele tenha partido, sua lenda perdurará por muito tempo ainda, pois como costumo dizer, heróis nunca morrem.

Quem quiser contar quem foram seus primeiros heróis, fique à vontade.


P.S.: Assistam o documentário Senna, do documentarista britânico Asif Kapadia (aliás uma vergonha pro Brasil este filme ter sido feito por um inglês) lançado no ano de 2010, para quem não se lembra ou não viveu a época é a chance de conhecer e sentir um pouco do que Senna representava. E pra quem lembra, viveu a época e é fã (como eu), segure as lágrimas, as lembranças são fortes.


Esta ilustração é minha humilde homenagem a este grande piloto (e gênio) brasileiro.


Aqui um vídeo do que os críticos da F1 consideram a melhor volta de um piloto na história da categoria. O GP da Europa, em Donington Park, na Inglaterra, em 1993.

quinta-feira, 24 de março de 2011

DOCE PESADELO

Uma noite de inverno, e o clichê em forma de chuva. Pergunto-me onde estou, de onde venho, questiono minha sobriedade e constato minha falta de reflexos. Caminho cambaleante por uma rua desconhecida. O frio ainda não incomoda, não tanto quanto meus tênis molhados. E agora minha mente retorna, chacoalhante como um terremoto.


Ainda tento acender um cigarro, mas a chuva insiste em apagar a chama do isqueiro. Minha capacidade de autodestruição torna-se cada vez mais insaciável, perco meu senso de direção. Anseio por achar um bar aberto, mas esta cidade costuma dormir mais cedo do que minha vontade de sair da realidade.


Não havia sol em meus olhos opacos, não havia esboço de sorriso em meu rosto carrancudo e não havia esperança em minhas poucas palavras, proferidas com a desilusão de um condenado leproso. As odes que escrevi, os poemas que declamei, os versos que me acordaram no meio da noite. Tudo em vão.


Penso no que parece ser um rascunho mal-feito de um roteiro de uma vida desgraçada. Apenas eu. E enquanto a chuva leva minha embriaguez, consigo limpar meus pensamentos, hipnotizado por minha última alucinação; aquela silhueta curvilínea e seu perfume inconfundível que entorpece meus sentidos. Uma doce miragem.


O vento sibila, sordidamente frio em meus ouvidos. A chuva dá uma trégua em nossa cumplicidade recente, permite que eu acenda um cigarro. Acalma meus pensamentos, que ricocheteavam freneticamente em minha mente claustrofóbica. E é só isso; uma caminhada sem rumo, sem sentido, a inércia que me faz querer atingir o solo com força, o esforço que nunca fiz por mim. 


Chego em casa, ainda é madrugada na cidade dos mortos. Ouço o som dos sonos ao redor se misturando ao silêncio perturbador; ecoam como tambores de guerra em minha cabeça. Meus olhos secos pedem descanso; a insônia não é generosa como a chuva. Deito no escuro e imagino como é sonhar com seu mais lindo desejo; sonhar sem ter que acordar para descobrir que tudo não passou de um sonho...

"E tudo parecia nada..."

sexta-feira, 4 de março de 2011

VÍCIO


















O coração ainda acelera
O fôlego ainda foge
A inspiração e a transpiração
Aquela incerteza intrigante
Dos dias que (não) virão
Da beleza dos sonhos esquecidos
Do doce sabor do vício
Vem o pudor da ansiedade
O lindo terrorismo da saudade
Depois da despedida, a noite vazia
Depois do beijo, o desejo
Então a dúvida angustia
E na solidão da estrada
O inferno como jornada
Sangue que endurece o coração
Desvanecendo o medo
Desencorajando a frustração
Olhos que se fecham no escuro
Anseiam pelo sono profundo
Sonho de uma breve eternidade
Suaviza e entorpece a alma
A sensação de acalmar a dor
A vontade de esquecer o pudor
Da agonia mental da claustrofobia
Incontrolável desejo de se perder
De ser, de perecer... Sem merecer (?)
Lembrar daqueles olhos...
Lembra o doce sabor do vício...

Amor é suicídio...



quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

ABSTRATO

Não me lembro da última vez que a observei maravilhado assim. Há muito venho me fechando para o resto do mundo, inclusive para ela. Estar sóbrio me ajuda a ver as coisas mais claramente. Agora já sei exatamente o que devo fazer. Embora ainda lute muito para me convencer a tomar uma decisão tão perturbadora.

Já passava das onze da noite quando ela chegou do trabalho. Eu estava sentado na poltrona da sala, com as luzes apagadas, vendo o jogo do Phoenix na televisão. Ela parecia esgotada e apenas deitou a cabeça sobre o meu colo, sem dizer nada e em poucos minutos adormeceu. Seus olhos, seus lábios, seu cabelo ligeiramente avermelhado... É, eu me lembro daquela época, quando eu não era um degenerado autodestrutivo.

A sala escura, a garrafa de whisky e o copo ao lado da poltrona, o cheiro da fumaça do cigarro no cinzeiro começa a me incomodar; é hora de parar, por hoje. Desligo a TV, é uma noite fria, eu a abraço, de certo modo. Inconsciente ou não, ela sorri suavemente. A garota de meus sonhos, a melhor parte dos meus dias, um oásis de paz em minha mente perturbada; havia eu me esquecido. Ela não.

A luz, que vem dos faróis dos carros que passam na rua, entra pela janela e quebra as trevas que me impedem de contemplá-la por inteiro. Tive todo o tempo do mundo e o desperdicei, agora me arrependo. Mas não há mais tempo para declarações de amor nem para pedir desculpas, nunca fui bom nisso. Ela está cansada. Cansada de mim, sei disso, embora ela não admita. E eu também estou.

Eu a carrego cuidadosamente em meus braços até o quarto, ela me abraça, de certa forma. Um beijo no rosto e ela adormece, agora na cama. Algumas roupas, meus dois pares de tênis, minhas velhas e empoeiradas graphic novels, minha surrada e vermelha fender stratocaster e meus últimos cigarros. É quase tudo o que eu tenho. O mais importante de tudo deixarei na cama, adormecida. 

Costumávamos cantar, eu tocava e ela cantava; ela queria cantar e era boa nisso. Então eu adquiri o dom de interferir, até ela desistir. A pior de todas as coisas ruins que eu fiz; estragar o sonho dela...

Caminho solitário pelas calçadas úmidas, sem rumo. Irei para o mais longe possível, até desaparecer, então ela poderá me esquecer. Um dia alguém me falou: "Se você ama uma pessoa, deixe-a livre". Agora talvez ela possa voltar a sonhar, porque o meu sonho acabou...


terça-feira, 4 de janeiro de 2011

2011: UMA ODISSÉIA NA ESTRADA

É curioso como a incapacidade e a preguiça de planejar certas coisas proporcionam momentos únicos na vida de certas pessoas. Mas convenhamos, planejar é muito chato e correr riscos é muito mais divertido. Principalmente quando se trata de três almas despreocupadamente inconsequentes. 

Antes de uma viagem por locais desconhecidos, a maioria das pessoas geralmente faz um roteiro de viagem, se municiam de mapas, GPS, bússolas (ok, exagerei), fazem reserva em algum hotel ou pousada na cidade que desejam chegar... enfim, planejam cuidadosamente, com antecedência, cada passo que irão dar a cada quilômetro rodado para evitar transtornos desnecessários. 

Era final de tarde de algum dia de dezembro de 2010 e, como de costume, estávamos apreciando algumas cervejas num boteco conhecido da cidade de Camaçari, quando surgiu a ideia de passar o réveillon na praia. Original, não? Mas a praia sugerida era em Aracaju. E o melhor: A viagem seria feita de carro, coisa que nunca tínhamos feito antes. Combinamos, então, de nos encontrarmos dois dias antes da viagem para planejar tudo. A “reunião” foi no mesmo bar e tudo que fizemos foi beber. Planejar? Pra quê?

Na noite do dia 30 entramos em contato pra marcar o local e o horário de saída. Nos encontramos e lá fomos nós, três velhos amigos, rumo ao desconhecido. Levamos algumas roupas – duas ou três – mas nada para comer ou beber (me refiro à água). Tínhamos vários giga bytes de música, e isso era tudo que precisávamos, antes é claro de nosso amigo Rosário soltar seu velho, conhecido e constante bordão: “tô com fome!”. O plano – obviamente feito já durante a viagem –  era parar em algum posto e abastecer o carro e nossos estômagos também.

Já deixávamos os limites da cidade quando resolvemos decidir qual o melhor caminho para chegar à capital sergipana (exato. Decidimos o roteiro durante a viagem). Naturalmente recorremos à Deus – me refiro ao Deus Google e seu fascinante Google maps – para nos guiar pelas sinuosas estradas do litoral baiano (a tecnologia não é maravilhosa?). Mas descobrimos que Google não é tão onipotente assim (ou nós é que somos muito idiotas e não sabemos seguir um mapa) e acabamos nos perdendo, mas obviamente ainda não tínhamos admitido isso. Então paramos em um boteco de beira de estrada; e aqui vale ressaltar uma observação feita pelo camarada Di Paula: “Se tem uma coisa que não falta na estrada é bar! Não vi nenhum hospital até agora!”.

Entramos naquela pocilga empoeirada e pedimos algumas garrafas d’água. Depois de um tempo, perguntamos para o simpático senhor qual o melhor caminho para chegar até à Linha Verde (rodovia que nos levaria até nosso destino), e ele apontou para uma estrada que estava logo à nossa frente. Terminamos de beber a água e depois de comprar alguns mantimentos para o resto da viagem (balas e doces de amendoim) seguimos pela estrada indicada. No início tudo corria bem, a pista era bem pavimentada e bem sinalizada, até o asfalto começar a sumir e dar lugar a uma estrada de terra e cascalho.

O caminho era deserto e os buracos na pista lembravam a superfície lunar. Não vimos sinais de civilização por quilômetros. De repente vimos um ônibus vindo em direção contrária (e logo depois uma distinta senhorita que urinava graciosamente no fundo de um ônibus parado) e deduzimos que aquela estrada não levava direto ao inferno, que talvez aquele fosse realmente o caminho certo, o problema é que nunca terminava e as condições da pista tornava a viagem cada vez mais perigosa, pois no caso de um pneu furado, não teria como trocar já que não tínhamos um macaco hidráulico nem chave-de-roda (foi burrice sair sem estes equipamentos, eu sei, mas não planejamos, lembram-se?).

O melhor era a nossa expectativa de que a qualquer momento o asfalto da pista ia surgir e chegaríamos à Linha Verde. Minha irritação era visível, quando o Sr. Rosário começou a rir, isso mesmo, ele estava rindo, imaginando os palavrões que eu soltaria caso não conseguíssemos sair daquela estrada. Falei para o próprio depois que, caso eu não estivesse dirigindo, encheria a fuça dele de socos. Mas não foi necessário partir para agressões físicas.

Quando já estávamos quase perdendo a esperança, eis que Rosário avista no horizonte alguns carros trafegando, foi aí que percebemos que a estrada do inferno chegava ao fim e estávamos diante da Linha Verde. Gritamos como se fora um gol da Seleção brasileira em final de Copa do Mundo. Paramos o carro diante da rodovia, para descansar um pouco e para registrar o momento. Há alguns metros dali havia um posto, então paramos lá para almoçar.

Depois de nos recuperarmos da estrada do inferno, de almoçar e descansar, seguimos viagem, agora pelo caminho certo, rumo à cidade de Aracaju. A viagem foi tranquila e chegamos já no cair da noite na capital sergipana. Chegando lá a primeira providência deveria ser procurar um local para nos hospedarmos, considerando que deveria ter bem poucos quartos disponíveis, mas nós não somos assim. Tentamos achar onde seria o local da festa primeiro, para aí sim, tentar achar um local próximo para ficarmos.

Por sorte – quem diria – conseguimos um quarto adequado próximo ao local da festa. E depois de nos limparmos da sujeira da estrada, trocar de roupas e nos alimentarmos, fomos em direção à festa. Não eram nossos cantores e bandas favoritos (entre eles Diogo Nogueira e Margareth Menezes), mas estávamos nos divertindo. A meia noite chegou e o show pirotécnico foi muito bem feito. Já era 2011, quando “descobrimos” que do outro lado da praia rolava uma rave, naturalmente foi onde ficamos. Depois de algumas bebidas e de “dançar” um pouco, voltamos cedo para a pousada (mais ou menos às 04h20min) pois a volta para casa seria no dia seguinte e era preciso descansar um pouco.

A volta, naturalmente, foi bem tranquila, pois já conhecíamos o caminho (se bem que, do jeito que somos desorientados, o risco de se perder de novo existia). Enfim, essa foi a epopeia de réveillon de três bons e velhos amigos. Essa coisa toda de réveillon, de virada do ano, não é uma coisa que nos comova tanto quanto comove a maioria das pessoas, mas era a chance de nos divertirmos, como nos velhos tempos. E apesar de todos os percalços durante a viagem, foi bem divertido... Final do ano tem mais... E dessa vez, sem atalhos na estrada!


"Di Paula e Rosário, vocês são foda, manos!"