quinta-feira, 26 de maio de 2011

CANÇÃO DO SILÊNCIO

Se eu pudesse não me arrepender... Se eu pudesse ter esperança...

Se eu conseguisse acreditar... Se eu tivesse o dom (ou maldição) da fé...

Se eu conseguisse dormir... Se eu expurgasse meu pessimismo...

Se eu tivesse medo... Se eu controlasse meus impulsos...

Se eu controlasse minha sinceridade... Se eu não me perdesse na madrugada...

Se eu não me questionasse... Se eu não mergulhasse em garrafas de vodka...

Se minha memória não insistisse em me lembrar...

Se em minhas veias, meu sangue estivesse limpo...

Se em meus olhos houvesse brilho... Se minha voz não me irritasse tanto...

Se o silêncio em minha mente não fosse tão perturbador... Se fosse fácil fugir de meu inferno...

E meus demônios fossem domáveis... Se eu não ocultasse meu entusiasmo...

Se eu pudesse recolher as minhas cinzas... Depois do fogo que me consumiu...

Ah... E se naquela noite os desejos fossem reprimidos... 

Se aqueles dias não tivessem me feito tão feliz... Como nunca fui...

Se aqueles dias não tivessem importância... Eu esqueceria...

Se apenas desculpas bastassem... Minha corrosão não seria tão dolorosa...

Se um dia eu me curar da tristeza dessa ausência... Poderei partir em paz...

E se meu coração obedecesse minha lógica... Eu não te amaria tanto assim...



"And she knows..."

quarta-feira, 4 de maio de 2011

CELEBRAÇÃO DO MEDO

Quem não se lembra do 11 de setembro de 2001? Da imagem das torres do World Trade Center, em New York, em chamas como num filme apocalíptico do Roland Emmerich. Do desespero de quem fugia do local do atentado, da revolta de boa parte do mundo ocidental, quando o auto-proclamado autor do atentado, Osama Bin Laden, revelou-se para o planeta. Lembro também que em muitos países do Oriente Médio, muitas pessoas, que nutriam o sentimento anti-americano, saíram às ruas para comemorar o sucesso do ataque ao coração da “capital do mundo”, ao símbolo maior do capitalismo e do “american way of life”. Sim, lembro de muita gente por aqui que achou um absurdo a alegria dessas pessoas diante de ato tão desumano.

Quase dez anos depois, após caçada implacável em cavernas nas montanhas do oriente, que resultou em duas guerras, em dois países diferentes, muitas vidas de inocentes perdidas, instabilidade na economia mundial, dúvida da sanidade mental do então presidente estadunidense George Walker Bush, eis que as agências de notícias do mundo inteiro noticiam na madrugada de segunda-feira que o homem mais procurado do planeta fora finalmente morto por tropas americanas. Resultado: Festa na terra dos Yankees! A população saindo às ruas, com tremulantes bandeiras americanas, celebrando mais efusivamente que nós brasileiros quando a Seleção nacional de futebol retorna do exterior com a Copa do Mundo. Sim, as pessoas estavam felizes; felizes porque um homem foi assassinado.

Bem, todos sabem que Osama Bin Laden não era uma boa pessoa, que orquestrava atentados em todo o mundo, que tirou a vida de vários inocentes, usando e distorcendo a religião que nada tem a ver com as atrocidades que ele cometia. Não estou questionando se ele merecia ou não morrer, talvez até merecesse. Mas a cena de pessoas comemorando a morte de outra, estejam elas no oriente, no ocidente, no norte ou no sul, como se fosse uma festa, simplesmente não entra na minha cabeça. Esta é a humanidade que estamos construindo? Que simplesmente adota a vingança como política em troca de popularidade? Que festeja a morte de outros seres humanos com tanta euforia? Sinceramente não entendo...

Entendo que se sintam aliviados por um terrorista não estar mais entre os vivos, que ele não pode mais fazer mal a ninguém, – não que a morte dele tenha sanado a ameaça terrorista no mundo – mas promover uma celebração coletiva com sorrisos e com tanta paixão, pela morte de seres humanos? Não me refiro apenas aos norte-americanos, mas também àqueles que lá no oriente, em 2001 também celebraram as mortes no World Trade Center. Somos tão bárbaros assim mesmo? É isso que chamamos de civilização? É assim que nos auto-intitulamos evoluídos? Se for isso que chamamos de humanidade, tenho vergonha de fazer parte dela.

Os noticiários e o governo americano tentam passar uma imagem de vitoriosos, propagam que “venceram a ameaça”, que o mundo é um lugar melhor agora, que Osama Bin Laden foi derrotado. Bem, o planeta vive em permanente estado alerta, as sociedades, tanto ocidentais quantos as orientais aumentam diariamente seus níveis de segurança, os próprios Estados Unidos da América vivem a paranóia da segurança extrema, onde qualquer incêndio em pet shop, vira suspeita de terrorismo. Estão governados pelo medo. E mesmo assim acham que venceram? Se isso é vitória, o preço foi alto demais.

domingo, 1 de maio de 2011

MEU PRIMEIRO HERÓI

Eram tempos de brincadeiras de criança, de andar de bicicleta, de odiar acordar cedo para ir à escola, mas aos domingos era um prazer levantar antes do relógio marcar dois dígitos. Era diversão, era idolatria, era religião. No país do futebol, o automobilismo – mais especificamente a Fórmula 1 – tornava-se o esporte mais popular do Brasil, e tudo graças a um homem, uma lenda, um brasileiro: Ayrton Senna da Silva.

Eu não tinha idade pra entender o que ele representava para um país recém-saído de uma ditadura militar, que não dava aos seus cidadãos motivos para orgulhar-se de sua terra, mas para mim ele era um herói, no mais puro sentido da palavra. Achava que ele tinha poderes, que era invencível, eu queria ser como ele. Queria todos os brinquedos que faziam alguma referência à Senna ou à F1. Apostando corrida de bicicleta com amigos, eu dizia que meu nome era Senna, era também o nome que usava no Top Gear, do Super Nintendo (zerei o jogo com este nome! hehehe).

Eram tempos em que os pilotos controlavam as máquinas e não as máquinas que faziam os campeões. E Senna era um vencedor, obcecado pela vitória, pela competição. Quando entrava no cockpit, nada mais importava, só a corrida, só a vitória.

Era incrível vê-lo correr e após receber a bandeirada final como vencedor, parar em algum ponto da pista para pegar a bandeira brasileira e exibi-la tremulante até o ponto mais alto do pódio. Posso dizer que ele me fez entender o que era ser parte de um país, e de alguma forma ter orgulho de ter nascido no mesmo país de uma figura tão impressionante.

Bem, hoje é 1 de maio, dia da morte de Senna, há dezessete anos, no circuito de Ímola, na Itália. Eu poderia escrever linhas e mais linhas de como me senti naquele dia, mas tenho certeza de que não saberia explicar a sensação. Só posso dizer que foi muito doloroso ver meu primeiro herói morrer ao vivo. E embora ele tenha partido, sua lenda perdurará por muito tempo ainda, pois como costumo dizer, heróis nunca morrem.

Quem quiser contar quem foram seus primeiros heróis, fique à vontade.


P.S.: Assistam o documentário Senna, do documentarista britânico Asif Kapadia (aliás uma vergonha pro Brasil este filme ter sido feito por um inglês) lançado no ano de 2010, para quem não se lembra ou não viveu a época é a chance de conhecer e sentir um pouco do que Senna representava. E pra quem lembra, viveu a época e é fã (como eu), segure as lágrimas, as lembranças são fortes.


Esta ilustração é minha humilde homenagem a este grande piloto (e gênio) brasileiro.


Aqui um vídeo do que os críticos da F1 consideram a melhor volta de um piloto na história da categoria. O GP da Europa, em Donington Park, na Inglaterra, em 1993.