domingo, 20 de janeiro de 2013

BAIANA NÃO PRATICANTE

De Clara Albuquerque, repórter do Correio

Não, eu não gosto de carnaval. Não, eu não conheço a música nova de Ivete Sangalo ou Claudia Leite e muito menos me interesso se uma delas anda de ônibus. Não, eu não tenho balangandãs e, portanto, realmente, Caymmi, eu não vou ao Bonfim. 

Não, eu não espero o ano inteiro pelas festas de verão. Eu não gosto de caruru. Não, eu não "me bato, me quebro tudo por amor, eu sou do pelô". Não me peça pra escolher entre Asa de Águia e Chiclete com Banana. Não pulo quando ouço nenhum dos dois. Capoeira, Banda Eva, água de côco? Não, não e não também. E, não, eu não corro pra praia quando faz sol. Na verdade, eu fujo de calor. Do humano também. 

E haja calor humano pra tanto verão. Porque se a Bahia é Bahia e as pessoas esperam que você sorria, ela é ainda mais gargalhada no Verão. Como um caldeirão cheio de bolinhos de felicidade que ferve no dendê da baiana, aquela de branco, de torço na cabeça mesmo, "sabe não"? E ai de você que não saiba fazer quindim ou cocada, que não seja uma menina faceira, que não vá "atrás do trio elétrico dançar ao negro toque do agogô, curtindo sua baianidade nagô ô ô ô ô ô". 

Porque parece que pra merecer o título de baiana você tem que ser assim: uma mistura retada de alegria, ritmos e cores que brilham ainda mais entre dezembro e março. Um pontinho de simpatia eterna e gratuita exposto numa prateleira ao lado de uma caixa de som bem alta, tocando axé, é claro, pronto pra fazer alguém feliz. 

Me poupem de tanto confete. Porque baiano também pode gostar de rock, também pode ser reservado, também pode preferir o silêncio, também pode ser ateu (simpatizante ou não do candomblé). Sabe aquela história que dá pra ser mulher e também gostar de futebol, ser rockeiro e não usar drogas, ter tatuagem e não ser marginal? Pois bem, dá pra gostar de Jorge Amado, sim, sem ser uma Gabriela, e também é possível viver em Salvador sem ser um tabuleiro de diversão, feitiço e afeição ambulante. 

E pra terminar o desabafo, antes que vocês me amarrem com fitinhas do Bonfim e me obriguem a escutar o novo hit da estação, enquanto jogam pipoca em mim, eu assumo: sim, eu gosto de acarajé e visto branco na sexta-feira. E pra que não fique nenhuma dúvida, apesar de todos os nãos deste texto, encerro com um sim, dito de boca bem cheia: sim, eu sou baiana.